Interpretando Escritura de acordo com as Escrituras:
Em Busca da Compreensão da Hermenêutica Adventista do Sétimo Dia
Richard M. Davidson é professor de Exegese do Antigo Testamento na Andrews University e antigo presidente da ATS (Adventist Theological Society). É autor de diversos livros e artigos, com destaques para “Flame of Yahweh: A Theology of Sexuality in the Old Testament” [A Paixão de Yahweh: Uma Theologia da Sexualidade no Antigo Testamento], “A Love Song for the Sabbath” [Uma Canção de Amor para O Sábado] e New Testament Use of the Old Testament [O Uso do Antigo Testamento no Novo Testamento].
Tradução: Hugo Martins
O artigo “Interpretando Escritura de acordo com as Escrituras: Em Busca da Compreensão da Hermenêutica Adventista do Sétimo Dia” (Original em Inglês: “Interpreting Scripture According to the Scriptures: Toward an Understanding of Seventh-day Adventist Hermeneutics”), por Richard Davidson, foi publicado, inicialmente, pelo Bíblical Reasearch Institute. Usado com permissão.
Como devemos abordar a Escritura? Com que hermenêutica devemos conduzir nossas investigações teológicas? Deparamo-nos com inúmeras teorias hermenêuticas antigas e modernas. Estas vão desde a hermenêutica alegórica da escola alexandrina e da Igreja medieval, até a hermenêutica literal-histórica e tipológica da escola antioquena e dos reformadores protestantes; da hermenêutica racionalista (histórico-crítica) antissobrenatural do Iluminismo à hermenêutica da compreensão subjetiva de Schleiermacher; da neo-ortodoxia de Barth e Brunner, aos modelos existencialistas de Heidegger e Bultmann; das teorias hermenêuticas metacríticas de Gadamer e Pannenberg, à hermenêutica da redução e amplificação de Paul Ricoeur; da hermenêutica da teoria sociocrítica (incluindo a hermenêutica da libertação e feminista) às novas abordagens hermenêuticas crítico-literárias (crítica retórica, Nova Crítica, estruturalismo, semiótica, teoria narrativa, etc.); da crítica da resposta do leitor ao desconstrucionismo radical.1
Diante dessa infinidade de metodologias hermenêuticas sugeridas, como devemos proceder em nossa abordagem das Escrituras? Parece evidente que sem revelação divina específica sobre o tema da hermenêutica, nunca seremos capazes de encontrar nosso caminho através do labirinto das teorias humanas. Por outro lado, se aceitarmos a plena autoridade das Escrituras2 em relação a outras doutrinas bíblicas, não deveríamos também esperar encontrar nas Escrituras a perspectiva divina de como interpretar as Escrituras? Os adventistas do sétimo dia creem que, assim como recorremos às Escrituras a fim de encontrar as doutrinas de Deus, humanidade, pecado, escatologia, etc., é apropriado, sim, essencial, que devemos recorrer às próprias Escrituras para descobrir a doutrina das Escrituras, e, particularmente, aprender o ensino bíblico sobre hermenêutica como base para a construção de uma teologia que seja hermeneuticamente fiel às Escrituras.
Naturalmente recorremos às Escrituras reconhecendo nossos próprios preconceitos, nossos próprios pré-entendimentos, mas também dispostos e reivindicando a promessa divina que o Espírito trará nossas pressuposições cada vez mais em harmonia com as pressuposições bíblicas (ver Jo 16:13; 14:16, 17, 26, etc.). Tenta-se neste artigo resumir o que os adventistas do sétimo dia entendem ser os principais contornos das pressuposições bíblicas e princípios de interpretação, à medida que emergem de um estudo das passagens bíblicas que tratam desse tópico.3
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Princípios Fundamentais para Interpretação Bíblica
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Pela Bíblia e Somente pela Bíblia (Sola Scriptura)4
Um princípio fundamental estabelecido pela Escritura a respeito de si mesma é que somente a Bíblia é a norma final da verdade, a fonte primária e absoluta de autoridade, o tribunal de apelação final, em todas as áreas da doutrina e prática. O texto clássico que expressa esta premissa básica é Is 8:20: “À lei e ao testemunho! Se eles não falarem segundo esta palavra, jamais verão a luz do alvorecer.” As duas palavras hebraicas tōrāh (“Lei”) e tecudah (“testemunho”) apontam para os dois focos de autoridade nos dias de Isaías que agora constituem a Sagrada Escritura: o Pentateuco (a Torá ou Lei de Moisés) e o testemunho dos profetas para a vontade de Deus na previamente revelada Torá. Jesus resumiu as duas divisões das Escrituras do AT de maneira semelhante quando se referiu à “Lei e aos profetas” (Mt 5:17; 11:13; 22:40). O NT acrescenta a revelação autoritativa dada por Jesus e suas testemunhas apostólicas (ver Ef 2:20; 3:5). O princípio da Sola Scriptura implica dois corolários: a primazia e a suficiência das Escrituras.
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A Primazia das Escrituras. Isaías advertiu o Israel apóstata contra se desviar da autoridade da Lei e dos Profetas a fim de buscar conselho de médiuns (Is 8:19). Na era do NT, outras fontes de autoridade ameaçavam usurpar a autoridade final da revelação bíblica. Uma delas era a tradição. Mas Jesus e Paulo indicam claramente que a Escritura é a autoridade superior sobre a tradição, incluindo a tradição das autoridades religiosas (Mt 15:3, 6; Col 2:8). Isso não nega a utilidade da tradição judaico-cristã, como alguns interpretam erroneamente a Sola Scriptura, mas defende a primazia da Escritura sobre toda a tradição como a norma final da verdade. A tradição, mesmo a tradição eclesiástica, deve ser julgada pelas Escrituras.
Paulo também rejeita enfaticamente outra fonte de autoridade, a da filosofia humana, como norma final da verdade para o cristão (Cl 2:8). Mesmo os pressupostos filosóficos da teologia fundamental devem ser julgados pelo padrão da Sola Scriptura. Os adventistas do sétimo dia creem que muito do pensamento fundamental cristão (“os princípios por trás dos princípios”) desde pouco depois dos tempos do NT tem sido dominado por fundamentos filosóficos dualistas (platônico-aristotélicos) que apresentam um conceito atemporal e sem espaço de Deus. Assim, as passagens nas Escrituras que falam de Deus habitando em uma realidade espaço-temporal devem ser desconstruídas e reinterpretadas em termos alegóricos, figurativos ou metafóricos. Os adventistas veem o ensino bíblico sobre Deus como incluindo um chamado aos cristãos para um retorno radical ao realismo bíblico da Sola Scriptura que vê o ser de Deus compatível com o espaço e o tempo.5
Paulo também rejeita o “conhecimento” humano (NAA “conhecimento”; gnōsis grego) como a autoridade final (1Tm 6:20). Tanto os escritores do AT quanto do NT apontam que desde a queda no Éden, a natureza se tornou depravada (Gn 3:17–18; Rm 8:20–21) e não reflete mais a verdade perfeitamente. A natureza, corretamente entendida, está em harmonia com a revelação escrita de Deus nas Escrituras (ver Sl 19:1–6 [revelação de Deus na natureza] e vv. 7–11 [revelação do Senhor nas Escrituras]); mas como uma fonte limitada e avariada de conhecimento sobre Deus e a realidade, deve ser considerada subserviente e interpretada pela autoridade final das Escrituras (Rm 1:20–23; 2:14–16; 3:1–2).
As faculdades mentais e emocionais da humanidade também se tornaram depravadas desde a Queda; mas mesmo antes da queda, nem a razão humana nem a experiência podiam ser seguramente confiáveis aparte ou superiores à Palavra de Deus. Este foi exatamente o ponto sobre o qual Eva caiu: confiar em sua própria razão e emoções sobre a Palavra de Deus (Gn 3:1–6). O homem mais sábio da história (que no final das contas não atendeu a sua própria advertência) observou com perspicácia: “Há caminho que ao homem parece direito, mas o seu fim é o caminho da morte” (Pv 14:12).
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A Suficiência das Escrituras. O princípio da Sola Scriptura implica o corolário adicional da suficiência das Escrituras. A Bíblia somente é o guia infalível para a verdade e suficiente tornar alguém sábio para a salvação (2Tm 3:15). É o padrão pelo qual toda doutrina e experiência devem ser testadas (2 Tm 3:16–17; Sl 119:105; Pv 30:5, 6; Is 8:20; Jo 17:17; At 17:11; 2 Ts 3:14; Hb 4:12). As Escrituras fornecem assim a estrutura, a perspectiva divina, os princípios fundamentais, para cada ramo de conhecimento e experiência. Todo conhecimento e experiência adicional, ou revelação, deve ser construído e permanecer fiel ao fundamento todo-suficiente das Escrituras. A suficiência das Escrituras não é apenas no sentido de suficiência material, ou seja, que as Escrituras contêm todas as verdades necessárias para a salvação. Os adventistas também acreditam na suficiência formal das Escrituras, ou seja, que a Bíblia somente é suficiente em clareza para que nenhuma fonte externa seja necessária para interpretá-la corretamente.
Os adventistas mantêm o grito de guerra da Reforma: Sola Scriptura, a Bíblia e somente a Bíblia como a norma final para a verdade. Todas as outras fontes de conhecimento e experiência devem ser testadas por este padrão infalível. A resposta humana apropriada deve ser de total rendição à autoridade suprema da palavra de Deus (Is 66:2).
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A Totalidade das Escrituras (Tota Scriptura)
Um segundo princípio geral da interpretação bíblica é a totalidade das Escrituras (Tota Scriptura). Não é suficiente afirmar a primazia das Escrituras. Aqueles como Martinho Lutero, que defendeu a Sola Scriptura, mas falhou em aceitar plenamente as Escrituras em sua totalidade, acabaram com um “cânone dentro do cânone.” Para Lutero, isso significava depreciar o livro de Tiago (como uma “epístola de palha”) e desprezar outras porções da Escritura (como apresentando o caminho da Lei e não o Evangelho).
O testemunho das Escrituras é claro em 2 Timóteo 3:16–17: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o servo de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.”
Toda a Escritura — não apenas parte — é inspirada por Deus. Certamente inclui todo o AT e as Escrituras canônicas da igreja apostólica (ver Lc 24:17, 32, 44–45; Rm 1:2; 3:2; 2 Pe 1:21; etc.). Mas, para Paulo, também inclui os escritos sagrados do NT. O uso que Paulo faz da palavra “escritura” (grafē, “escrever”) em sua primeira epístola a Timóteo (5:18) aponta nessa direção. Ele introduz duas citações com as palavras “As Escrituras dizem”, uma de Dt 25:4 no AT, e outra das palavras de Jesus registradas em Lucas 10:7. A palavra “escritura”, portanto, é usada simultaneamente e como sinônimo para se referir aos relatos do AT e dos evangelhos no sentido técnico de “escritos inspirados, sagrados e autorizados.”
Diversas passagens nos evangelhos afirmam sua veracidade e autoridade no mesmo nível que as Escrituras do AT (e.g., Jo 1:1-3 paralelo a Gn 1:1; Jo 14:26; 16:13; 19:35; 21:24; Lucas 1:2–4; Mateus 1 paralelo a Gênesis 5; Mateus 23:34). O uso de Pedro do termo “escrituras” para os escritos de Paulo apoia esta conclusão (2 Pe 3:15–16) [“como também o nosso amado irmão Paulo escreveu a vocês, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar a respeito destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas cartas. Nelas há certas coisas difíceis de entender, que aqueles que não têm instrução e são instáveis deturparão, como também deturparão as demais Escrituras, para a própria destruição deles”]. Ao comparar as cartas de Paulo com as “outras Escrituras”, Pedro dá a entender que a correspondência de Paulo é parte das Escrituras.
O NT é o testemunho apostólico de Jesus e seu cumprimento dos tipos e profecias do AT. Jesus prometeu aos doze apóstolos enviar o Espírito Santo para lhes relembrar o que ele disse (João 14:26). Paulo afirma que “o mistério de Cristo” foi “revelado aos seus santos apóstolos e profetas pelo Espírito” (Ef 3:4–5). Os apóstolos ocuparam uma posição única e irrepetível na história (Ef 2:20) como testemunhas do contato direto com a humanidade de Cristo (Lc 1:2; Gl 1:11–17; 2Pe 1:16; 1Jo 1: 1–4). Isso certamente valida os escritos apostólicos dos apóstolos como Pedro, João e Mateus. Paulo também foi chamado para ser apóstolo (ver Rm 1:1, 1Co 1:1, e as saudações nas outras epístolas paulinas), e ele indica que seus escritos são dados sob a liderança do Espírito Santo e têm plena autoridade (1Co 7:40; 12:13; 14:37; 2Co 3:5-6; 4:13; Gl 1:11-12; 1Ts 5:27; 2Ts 3:6–15). Assim, o NT incorpora o testemunho dos apóstolos, direta ou indiretamente por meio de seus associados próximos Marcos, Lucas, Tiago e Judas (ver Lucas 1:1–3; Atos 12:12, 25; 15:37; 16:11 ; Cl 4:10, 14; 2 Tm 4:11; Fl 24).
O princípio da Tota Scriptura abrange questões/corolários relacionados.
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Tota Scriptura e o Cânone. Qual é a extensão total do cânone bíblico, e quais forças/fontes “autorizaram” os diversos escritos bíblicos a serem canônicos? Os adventistas estão em consonância a outros protestantes ao afirmar que a canonização do AT e do NT não é um produto de agências humanas, mas do Espírito Santo, e que os livros canônicos contêm qualidades internas de auto-autenticação e auto-validação que foram reconhecidas como tal pela comunidade de fé.6
Em relação ao AT, os adventistas, como outros protestantes, aceitam apenas os 39 livros da Bíblia Hebraica, e não os chamados livros deutero-canônicos dos apócrifos. Os últimos livros, embora contenham algumas informações históricas úteis, não foram escritos por profetas inspirados, mas vieram após o término do período profético do AT (ca. 400 A.E.C.).7 Os adventistas aceitam uma data do século VI para a escrita de Daniel (em harmonia com as reivindicações internas do livro), e colocam a canonização do AT no tempo de Esdras e Neemias (cerca de 400 A.E.C.), ambos como profetas desempenharam um papel na popularização e afirmação dos livros canonizados entre o povo judeu (Ed 7:10; Ne 8:2–8). O próprio Jesus reconheceu o cânone hebreu de três partes (Lc 24:44), reafirmado no Concílio de Jâmnia (cerca de 90 E.C.).8
Com relação ao NT, já observamos acima o testemunho apostólico inerente a todos esses escritos — todos escritos por um apóstolo inspirado ou discípulo direto de um apóstolo que foi uma testemunha ocular inspirada — e assim o cânon do NT foi encerrado no final do primeiro século, quando o último documento apostólico inspirado foi escrito. Tal apostolicidade/canonicidade inspirada foi eventualmente reconhecida pela comunidade da aliança do NT. A Igreja “chegou a reconhecer, aceitar e confirmar a qualidade de auto-autenticação de certos documentos que se impuseram como tais à Igreja.”9 Em suma, a Igreja não determinou o cânone, mas o descobriu, não regulamentou o cânone, mas o reconheceu; a Igreja não é a mãe do cânone, mas a filha do cânone, não sua magistrada, mas sua ministra, não sua juíza, mas sua testemunha, não sua mestre, mas sua serva.10
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União Inseparável do Divino e do Humano. Toda a Escritura, tanto do AT como do NT, é de origem divina. É “inspirada por Deus”, literalmente “soprada por Deus” (2 Tm 3:16). A imagem aqui é a do “vento” divino ou Espírito vindo sobre o profeta, de modo que a Escritura é um produto do sopro criativo divino. Assim, é totalmente autoritativa: proveitosa para doutrina, repreensão, correção e instrução em justiça.
Um corolário do princípio Tota Scriptura é que toda a Escritura é uma união indivisível e indistinguível do divino e do humano. Uma passagem bíblica chave que esclarece a natureza divina das Escrituras em relação às dimensões humanas dos escritores bíblicos é 2 Pedro 1:19–21: “Assim, temos ainda mais segura a palavra profética, e vocês fazem bem em dar atenção a ela, como a uma luz que brilha em lugar escuro, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça no coração de vocês. Primeiramente, porém, saibam que nenhuma profecia da Escritura provém de interpretação pessoal; porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade [thelēma] humana; entretanto, homens falaram da parte de Deus, movidos [ferō] pelo Espírito Santo.”
Diversos pontos relacionados são desenvolvidos nesses versículos. V. 19 ressalta a confiabilidade das Escrituras: é a “mais segura a palavra profética.” No v. 20, aprendemos o porquê: porque a profecia não é uma questão de interpretação do próprio profeta, ou seja, o profeta não se intromete em sua própria interpretação. O contexto aqui aponta principalmente para o profeta dando a mensagem, que não injeta suas próprias ideias na mensagem, embora a implicação possa ser entendida pelo intérprete não inspirado das Escrituras.
V. 21 desenvolve este ponto: a profecia não vem pela thelēma — a iniciativa, o impulso, a vontade— do agente humano; os profetas não estão se comunicando por conta própria. Em vez disso, os escritores da Bíblia eram profetas que falavam à medida que eram movidos, levados e até mesmo conduzidos [ferō] pelo Espírito Santo.
Esta passagem petrina deixa claro que as Escrituras não vieram diretamente do céu, mas Deus utilizou instrumentos humanos. Um olhar indutivo sobre os escritos bíblicos confirma que o Espírito Santo não restringiu a liberdade dos escritores bíblicos, não suprimiu suas personalidades únicas, não destruiu sua individualidade. Seus escritos às vezes envolviam pesquisas humanas (Lc 1:1–3); às vezes eles relatam suas próprias experiências (Moisés em Deuteronômio, Lucas em Atos, os Salmistas); apresentam diferenças de estilo (contraste Isaías e Ezequiel, João e Paulo); eles oferecem diferentes perspectivas sobre a mesma verdade ou evento (e.g., os quatro Evangelhos). E, no entanto, por meio de toda essa inspiração de pensamento, o Espírito Santo conduziu os escritores bíblicos, guiando suas mentes na seleção do que falar e escrever, para que o que eles apresentem não seja apenas sua própria interpretação, mas a palavra totalmente confiável de Deus, a palavra profética tornou mais certa. O Espírito Santo imbuiu os instrumentos humanos com a verdade divina nos pensamentos e os ajudou a escrever, de modo que eles se comprometeram fielmente com as palavras apropriadas das coisas divinamente reveladas a eles (1 Co 2:10–13).
Este corolário do princípio da Tota Scriptura, de que os elementos humanos e divinos nas Escrituras estão inextricavelmente ligados, é reforçado pela comparação entre a Palavra de Deus escrita e encarnada. Visto que tanto Jesus quanto as Escrituras são chamados de “Palavra de Deus” (Hb 4:12; Ap 19:13), é apropriado comparar suas naturezas divino-humanas. Assim como Jesus, a Palavra de Deus encarnada era totalmente Deus e totalmente homem (Jo 1:1–3,14), a Palavra escrita é uma união inseparável do humano e do divino. Assim como a humanidade de Jesus era sem pecado, as Sagradas Escrituras, embora venham por meio de instrumentos humanos, são totalmente confiáveis.
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A Bíblia é Equivalente a, Não apenas Contém, A Palavra de Deus. Outro corolário do princípio da totalidade das Escrituras é que a Bíblia é equivalente a, e não apenas contém, a Palavra de Deus. O testemunho das Escrituras é impressionante. No AT há cerca de 1600 ocorrências de quatro termos hebraicos (em quatro frases diferentes com pequenas variações) que indicam explicitamente que Deus falou: (1) “a pronunciação [ne’um] de Yahweh”, cerca de 361 vezes; (2) “Assim diz [’āmar] o Senhor”, cerca de 423 vezes; (3) “E Deus falou [dibbēr], cerca de 422 vezes, e (4) a “palavra [dābār] do Senhor”, cerca de 394 vezes. Inúmeras vezes é registrada a equivalência entre a mensagem do profeta e a mensagem divina: o profeta fala por Deus (Ex 7:1,2; cf. Ex 4:15,16), Deus põe suas palavras na boca do profeta (Dt 18: 18; Jr 1:9), a mão do Senhor é forte sobre o profeta (Is 8:11; Jr 15:17; Ez 1:3; 3:22; 37:1), ou a palavra do Senhor vem para ele (Os 1:1; Joel 1:1; Mq 1:1; etc.). Jeremias (cap. 25) repreende sua audiência por não ouvir os profetas (v. 4), equivalendo a não ouvir o Senhor (v. 7) e as “suas palavras” (v. 8).
Resumindo as mensagens proféticas enviadas a Israel, 2 Rs 21:10 diz: Então o Senhor falou por meio de seus servos, os profetas,” e 2 Cr 36:15–16 acrescenta: “O Senhor , Deus de seus pais, sempre de novo falou-lhes por meio dos seus mensageiros . . .; Mas eles zombaram dos mensageiros de Deus, desprezaram as palavras dele e debocharam dos seus profetas . . .” A mensagem dos profetas é a mensagem de Deus. Por esta razão, os profetas muitas vezes mudam naturalmente da referência de terceira pessoa a Deus (“ele”), para a primeira pessoa (“eu”), sem qualquer “assim diz o Senhor” (ver Is 3:4; 5: 3ss.; 10:5ss; 27:3; Jr 5:7; 16:21; Os 6:4ss.; Amós 5:21ss.; Joel 2:25; Zc 9:7). Os profetas do AT tinham certeza de que sua mensagem era a mensagem de Deus!
Inúmeras vezes no NT “está escrito” é equivalente a “Deus diz.” Por exemplo, em Hebreus 1:5–13, sete citações do AT são ditas por Deus, mas as passagens do AT citadas nem sempre atribuem especificamente a declaração diretamente a Deus (ver Sl 104:4; Sl 45:6–7 ; Sl 102:25–27). Novamente, Romanos 9:17 e Gálatas 3:8 (citando Êx 9:16 e Gn 22:18 respectivamente) revelam uma identificação estrita entre a Escritura e a Palavra de Deus: as passagens do NT introduzem as citações com “a Escritura diz”, enquanto o AT passagens têm Deus como orador. As Escrituras do AT como um todo são vistas como os “oráculos de Deus” (Rm 3:2).
Embora a Bíblia não tenha sido ditada verbalmente por Deus para contornar a individualidade do autor humano, e assim as palavras específicas são as palavras escolhidas pelo escritor humano, mesmo assim os elementos humanos e divinos são inseparáveis, o mensageiro humano é guiado divinamente em sua seleção de palavras adequadas para expressar os pensamentos divinos, pois as palavras do profeta são chamadas de Palavra de Deus. As palavras individuais das Escrituras são consideradas confiáveis, representando com precisão a mensagem divina.
Isto é ilustrado por diversas referências do NT. Jesus diz, citando Dt 8:3: “O ser humano não viverá só de pão, mas de toda palavra [grego rhēma, “palavra”, traduzindo o hebraico qol, “tudo”] que procede da boca de Deus” (Mt 4:4). Paulo diz de sua própria mensagem inspirada: “Disto também falamos, não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas pelo Espírito, conferindo coisas espirituais com espirituais” (1 Co 2:13). Mais uma vez Paulo escreve: “Temos mais uma razão para, incessantemente, dar graças a Deus: é que, ao receberem a palavra que de nós ouviram, que é de Deus, vocês a acolheram não como palavra humana, e sim como, em verdade é, a palavra de Deus, a qual está atuando eficazmente em vocês, os que creem” (1Ts 2:13).
O que é declarado explicitamente no NT também é indicado pelos casos em que Jesus e os apóstolos baseiam um argumento teológico inteiro em um termo crucial ou até mesmo forma gramatical no AT. Assim, em João 10:33, Jesus apela para o Salmo 82:6 e o termo específica “deuses” para substanciar sua divindade. Acompanhando seu uso está a observação reveladora: “a Escritura não pode falhar [luō] . . .” (Jo 10:35). Não pode ser luō — solto, quebrado, revogado, anulado ou abolido — mesmo para os termos específicos. Em Mateus 22:41–46, Ele fundamenta seu argumento final e irretrucável aos fariseus sobre a confiabilidade da única palavra “Senhor” em Sl 110:1. O apóstolo Paulo (Gl 3:16) também fundamenta seu argumento messiânico no número singular da palavra “semente” em Gênesis 22:17–18. Como veremos abaixo, Paulo está reconhecendo o contexto messiânico mais amplo desta passagem, à medida que se move de uma semente plural coletiva para uma semente singular.
Jesus demostra seu respeito final pela plena autoridade da Torá do AT quando afirma sua totalidade: “Porque em verdade lhes digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra” (Mt 5:18).
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A Analogia das Escrituras (Analogia Scripturae)
Um terceiro princípio fundamental geral da interpretação bíblica pode ser denominado “a Analogia (ou Harmonia) das Escrituras” (Analogia Scripturae).
Visto que toda a Escritura é inspirada pelo mesmo Espírito, e toda ela é a Palavra de Deus, há, portanto, uma unidade e harmonia fundamentais entre suas diversas partes. As diferentes partes das Escrituras do AT são consideradas pelos escritores do NT como harmoniosas e de igual autoridade divina. Os escritores do NT podem, assim, apoiar seu ponto de vista citando várias fontes do AT como equivalentes e harmoniosas. Por exemplo, em Romanos 3:10–18 encontramos citações bíblicas de Eclesiastes (7:20), Salmos (14:2–3; 5:10; 140:4; 10:7; 36:2) e Isaías (59:7–8). A Escritura é considerada como um todo inseparável e coerente. Os principais temas do AT são creditados pelos escritores do NT e desenvolvidos.
Os dois Testamentos têm uma relação recíproca na qual se iluminam mutuamente. Jesus descreveu como o AT ilumina o NT (e ele próprio) em João 5:39: “Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim [ACF].” Em outro lugar, Jesus descreve como ele é o Iluminador, até mesmo o cumprimento, do AT: “Não penseis que cheguei à aplicação.11 As ponderações básicas sobre essa importância maior da lei já estavam no AT, e Jesus permite que essas gemas da verdade brilhem mais intensamente à medida que são libertadas das interpretações distorcidas de alguns escribas e fariseus. Revelação progressiva também ocorre no sentido de que Jesus é o cumprimento dos vários tipos e profecias do AT.
Uma aplicação prática final deste princípio de clareza é reconhecer a crescente espiral de compreensão à medida que uma passagem ilumina outra. Por um lado, autores bíblicos posteriores escrevem com consciência do que foi escrito antes e muitas vezes assumem e constroem sobre o que vem antes (às vezes chamado de princípio epigenético ou analogia da Escritura antecedente).12 Uma leitura atenta de uma passagem posterior pode indicar ecos ou alusões a passagens anteriores, e as passagens anteriores em seu contexto se tornam a chave para interpretar o significado mais completo da última (ver, por exemplo, a rica intertextualidade no livro de Apocalipse). Por outro lado, passagens anteriores podem não ser totalmente compreendidas até serem vistas à luz da revelação posterior. Isto é particularmente verdadeiro com tipologia e profecia (ver Mt 12:6, 42–43; 1 Pe 1:10–12). Assim, a espiral da compreensão cresce à medida que o posterior ilumina o anterior, e o anterior ilumina o posterior.
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”Questões Espirituais Discernidas Espiritualmente” (Spiritalia Spiritaliter Examinatur)
Um quarto princípio geral da interpretação bíblica diz respeito à questão da pré-compreensão ou objetividade. Nas abordagens hermenêuticas modernas em relação à Bíblia, tanto entre estudiosos críticos liberais quanto conservadores/evangélicos, frequentemente, assume-se que a intenção original do escritor da Bíblia pode ser determinada pela aplicação rigorosa de princípios hermenêuticos e ferramentas exegéticas, independentemente de qualquer assistência espiritual sobrenatural. Assim, os não-cristãos podem determinar o significado das Escrituras, assim como os cristãos, se usarem as ferramentas e aplicarem os princípios corretamente. Essa suposição é mantida no louvável interesse de manter um grau de objetividade na interpretação do texto bíblico.
No entanto, os dados bíblicos levam a uma conclusão diferente. Notamos em particular, 1 Coríntios 2:11, 14: “Pois quem conhece as coisas do ser humano, a não ser o próprio espírito humano, que nele está? Assim, ninguém conhece as coisas de Deus, a não ser o Espírito de Deus. . . . Ora, a pessoa natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura. E ela não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente.”
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O Papel do Espírito Santo. “As questões espirituais são discernidas espiritualmente.” Uma vez que a Bíblia não é o produto da mente do escritor humano, mas da mente de Deus revelada através do Espírito (cp. 1 Co 2:12–13), não é possível separar “o que ela significava” para o escritor humano — para ser estudado sem a ajuda do Espírito Santo, a partir “do que significa” — para ser aplicado com a ajuda do Espírito. Tanto o significado original quanto sua aplicação atual envolvem os pensamentos de Deus, que, segundo Paulo, só podem ser adequadamente compreendidos se tivermos a ajuda do Espírito de Deus (cp. João 6:45; 16:13; 1 Co 2:13–14; 2 Co 3:14–18).
Alguns resistem ao lugar do Espírito na espiral hermenêutica porque lhes parece permitir que o elemento subjetivo supere a sólida pesquisa exegética/hermenêutica. Bem verdade que somente a “exegese espiritual” — isto é, uma tentativa de confiar totalmente no Espírito sem aplicar conscientemente os princípios de exegese e hermenêutica oriundos das Escrituras, pode levar ao subjetivismo.
Mas a combinação adequada de dependência do Espírito com exegese rigorosa baseada em procedimentos hermenêuticos sólidos, longe de levar à subjetividade, constitui a única maneira de escapar da subjetividade. Estudiosos modernos estão cada vez mais dispostos a reconhecer que todos vêm às Escrituras com seus próprios pré-entendimentos, pressuposições, preconceitos. Isto não pode ser remediado abordando o texto “cientificamente” sem um “viés de fé.” De fato, uma vez que as Escrituras exigem uma resposta de fé, uma tentativa de postura “neutra” já está em conflito com a intenção das Escrituras (cp. Mt 13:11–17; Jo 6:69; At 2:38).
Intérpretes crentes e guiados pelo Espírito também vêm com seus próprios preconceitos e pré-entendimentos e não são imunes ao erro (cp. At 11:15). Mas para os cristãos que acreditam nas promessas das Escrituras, é possível pedir a Deus que transforme suas mentes para que adotem e incorporem cada vez mais as pressuposições das Escrituras e não as suas próprias (ver Rm 12:1). O Espírito da verdade foi prometido aos discípulos e a nós: “quando vier o Espírito da verdade, ele os guiará em toda a verdade” (Jo 16:13). Deve-se destacar que o Espírito dirige os intérpretes na comunhão do corpo da igreja (Sl 119:63; Atos 2:42; 4:32; Rm 12:4–8; 1 Co 12; Ef 4:3–6), onde eles podem ser beneficiado pela troca e correção de outros crentes.13
Os intérpretes devem decidir quais pré-entendimentos derivarão e estarão sob controle da própria Bíblia, e estarão constantemente abertos para modificação e ampliação com base nas Escrituras. Eles devem rejeitar conscientemente quaisquer chaves ou sistemas externos para impor à Escritura, seja naturalista (sistema fechado de causa e efeito sem espaço para o sobrenatural), evolucionário (o axioma do desenvolvimento), humanista (o homem a norma final), ou relativista (rejeição de absolutos). Eles devem pedir ao Espírito que inspirou a Palavra para iluminar, moldar e modificar seus pré-entendimentos de acordo com a Palavra, e guardar seus entendimentos para permanecerem fiéis à Palavra.
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A Vida Espiritual do Intérprete. “As questões espirituais se discernem espiritualmente” implica não apenas na necessidade do Espírito para auxiliar na compreensão, mas também na espiritualidade do intérprete. O Espírito não apenas ilumina a mente, mas também transforma o coração do intérprete. A abordagem do intérprete deve ser aquela exigida pela Escritura, uma atitude de consentimento ou vontade de seguir o que a Escritura diz, se ele quiser entender o significado da Escritura: “Se alguém quiser fazer a vontade de Deus, conhecerá a respeito da doutrina, se ela é de Deus ou se eu falo por mim mesmo” (Jo 7:17).
Deve haver oração diligente e fervorosa por entendimento, segundo o exemplo de Davi: “Ensina-me, Senhor, o caminho dos teus decretos, e os seguirei até o fim” (Sl 119:33; cp. vv. 34–40; Pv 2:3–7). Deve haver uma aceitação pela fé do que os profetas dizem (2 Cr 20:20; cp. Jo 5:46–47).
Em suma, a Bíblia não pode ser estudada como qualquer outro livro, vindo meramente “de baixo”, com ferramentas afiadas de exegese e princípios polidos de interpretação. Em cada etapa do processo interpretativo, o livro inspirado pelo Espírito só pode ser entendido corretamente “do alto” pela iluminação e transformação do Espírito. A palavra de Deus deve ser abordada com reverência. Talvez o melhor encapsulamento da postura apropriada do intérprete diante das Escrituras é registrado por Isaías: “Mas eis para quem olharei: para o aflito e abatido de espírito e que treme diante da minha palavra” (Is 66:2).
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Diretrizes Específicas para Interpretação
As diretrizes específicas para interpretar passagens bíblicas surgem e se baseiam nos princípios fundamentais que observamos nas Escrituras até agora. Essas diretrizes abrangem essencialmente o método histórico-gramatical, em contraste com o método histórico-crítico surgido do projeto iluminista.
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Dois Métodos Hermenêuticos Comparados
Os dois principais métodos hermenêuticos que acabamos de mencionar — o método histórico-crítico e o histórico-gramatical (também chamado histórico-bíblico) — podem ser comparados esquematicamente por meio do quadro a seguir.
Uma comparação dos dois principais métodos hermenêuticos modernos |
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Método Histórico-crítico |
Método Histórico-bíblico |
A. Definição: A tentativa de verificar a veracidade e entender o significado dos dados bíblicos com base nos princípios e procedimentos da ciência histórica secular. |
A. Definição: A tentativa de entender o significado dos dados bíblicos por meio de considerações metodológicas que surgem somente das Escrituras. |
B. Objetivo: Chegar ao sentido correto da Escritura, a intenção do autor humano conforme entendido por seus contemporâneos. |
B. Objetivo: Chegar ao significado correto da Escritura, o que Deus pretende comunicar, seja ou não plenamente conhecido pelo autor humano ou seus contemporâneos (1 Pe 1:10–12). |
C. Pressuposições Básicas |
C. Pressuposições Básicas |
1. Norma secular: Os princípios e procedimentos da ciência histórica secular constituem a norma externa e o método apropriado para avaliar a veracidade e interpretar o significado dos dados bíblicos. |
1. Sola Scriptura: A autoridade e a unidade da Escritura são tais que a Escritura é a norma final em relação ao conteúdo e método de interpretação (Is 8:20). |
2. Princípio da crítica (dúvida metodológica): a autonomia do investigador humano para interrogar e avaliar por conta própria, independentemente das declarações específicas do texto bíblico. |
2. A Bíblia é a autoridade máxima e não é suscetível ao princípio da crítica: os dados bíblicos são aceitos pelo valor nominal e não estão sujeitos a uma norma externa para determinar a veracidade, adequação, validade, inteligibilidade, etc (Is 66:2). |
3. Princípio da analogia: a experiência presente é o critério de avaliação da probabilidade de ocorrência de eventos bíblicos, uma vez que todos os eventos são, em princípio, semelhantes. |
3. Suspensão dos princípios convincentes de analogia para permitir a atividade única de Deus conforme descrito nas Escrituras e no processo de formação das Escrituras (2 Pe 1:19–21). |
4. Princípio de correlação (ou causação): um sistema fechado de causa e efeito sem espaço para a intervenção sobrenatural de Deus na história. |
4. Suspensão do princípio de correlação (ou causa e efeito natural) para permitir a intervenção divina na história conforme descrito nas Escrituras (Hb 1:1–2). |
5. Disjunção das Escrituras, uma vez que sua previsão envolveu muitos autores ou redatores humanos. A Escritura, portanto, não pode ser comparada com as Escrituras (“textos-prova”) para se chegar a um ensino bíblico unificado. |
5. Unidade das Escrituras, uma vez que os muitos autores humanos são supervisionados por um autor divino; portanto, a Escritura pode ser comparada com a Escritura para chegar à doutrina bíblica (Lc 24:27; 1 Co 2:13). |
6. Natureza “condicionada pelo tempo” ou “condicionada culturalmente” das Escrituras; o contexto histórico é responsável pela produção das Escrituras. |
6. Natureza atemporal das Escrituras: Deus fala através do profeta a uma cultura específica, mas a mensagem transcende as origens culturais como verdade atemporal (Jo 10:35). |
7. Os elementos humanos e divinos da Escritura devem ser distinguidos e separados: a Bíblia contém, mas não é igual à Palavra de Deus. |
7. Os elementos divinos e humanos nas Escrituras não podem ser distinguidos ou separados: a Bíblia é a Palavra de Deus (2 Tm 3:16–17). |
D. Procedimentos Hermenêuticos Básicos: |
D. Procedimentos Hermenêuticos Básicos: |
1. Crítica literária (fonte): A tentativa de reconstruir e entender hipoteticamente o processo de desenvolvimento literário que leva à forma atual do texto, com base no pressuposto de que as fontes são um produto da configuração de vida da comunidade que as produziu (muitas vezes em oposição a declarações bíblicas específicas sobre a origem e natureza das fontes). |
1. Análise Literária: Exame das características literárias dos materiais bíblicos em sua forma canônica, aceitando como unidade as unidades da Escritura que são apresentadas como tais, e aceitando sem reservas as declarações bíblicas específicas sobre as origens e a natureza dos materiais bíblicos. |
2. Crítica da forma: A tentativa de fornecer uma reconstrução conjecturada do processo de desenvolvimento pré-literário (oral) por trás das várias formas literárias, com base na suposição de que o material bíblico tem uma pré-história oral como a literatura popular convencional e como a literatura popular surge com base em tradições que são formadas de acordo com as leis inerentes ao desenvolvimento das tradições populares. |
2. Análise da forma: Uma tentativa de descrever e classificar os vários tipos de literatura encontrados na (forma canônica da) Escritura, aceitando pelo valor nominal o cenário de vida para cada forma, conforme indicado pelos dados bíblicos. |
3. Crítica de redação: A tentativa de descobrir e descrever o cenário de vida, as motivações sociológicas e teológicas que determinaram a base sobre a qual o redator selecionou, modificou, reconstruiu, editou, alterou ou adicionou materiais tradicionais para fazê-los dizer o que era apropriado dentro de sua nova configuração de vida de acordo com novas preocupações teológicas; assume que cada redator tem uma teologia e um cenário de vida únicos que diferem (e talvez contradizem) suas fontes e outros redatores. |
3. Análise teológica de livros bíblicos: Um estudo da ênfase teológica particular de cada escritor da Bíblia (de acordo com sua própria mentalidade e capacidade de compreensão), vista dentro do contexto mais amplo da unidade de toda a Escritura que permite que a Bíblia seja sua própria intérprete e as várias ênfases teológicas estejam em harmonia umas com as outras. |
4. História da tradição: A tentativa de traçar a história pré-composicional das tradições de estágio em estágio, transmitidas de boca em boca, de geração em geração, até a forma escrita final; baseado na suposição de que cada geração reformulou interpretativamente o material. |
4. Análise diacrônica (temática): A tentativa de traçar cronologicamente o desenvolvimento de vários temas e motivos (através da Bíblia em sua forma canônica); baseado na posição bíblica de que Deus dá revelação adicional (progressiva) às gerações posteriores, que, no entanto, está em plena harmonia com todas as revelações anteriores. |
5. Crítica canônica: A tentativa de reconstruir o cenário de vida (forças sociológicas e teológicas) na sinagoga e na Igreja Primitiva que determinaram a forma atual e o conteúdo do cânon bíblico; assume que as forças humanas explicam o processo de canonização. |
5. História do cânone: Exame do processo de canonização da Escritura, assumindo que os critérios de canonicidade são inerentes aos materiais bíblicos inspirados por Deus, e que o Espírito Santo guiou as comunidades judaica e cristã a reconhecer esses livros canônicos que preservaram a testemunho dos profetas do AT e dos apóstolos do NT. |
Observe as diferenças na definição, objetivos e pressupostos básicos. No que diz respeito aos pressupostos do método histórico-crítico, a primeira (“norma secular”) representa o ponto básico de orientação do método: “a razão humana e a supremacia da razão como critério último da verdade.”14 As pressuposições 2, 3 e 4 indicam os princípios fundamentais subjacentes do método (ver a formulação clássica destes por Troeltzsch em 1913); e os três últimos indicam que o método leva à destruição da unidade, relevância atemporal e plena autoridade das Escrituras.
Observe como a abordagem histórico-bíblica da hermenêutica rejeita cada uma dessas pressuposições baseadas em evidências bíblicas. Sobre o princípio da crítica em particular, Gerhard Maier, um notável estudioso alemão que rompeu com o método histórico-crítico, escreve: “um método crítico deve falhar, porque representa uma impossibilidade interior. Pois o correlativo ou contraponto à revelação não é a crítica, mas a obediência; não é uma correção do texto — nem mesmo com base em uma revelação aplicada parcialmente reconhecida — mas é um deixe-me ser corrigido”.15
Quanto aos procedimentos hermenêuticos básicos, observe como ambos os métodos analisam o contexto histórico, as características literárias, o gênero ou tipo literário, a teologia do escritor, o desenvolvimento dos temas e o processo de canonização. Mas a abordagem histórico-bíblica rejeita o princípio da crítica; analisa, mas se recusa a criticar a Bíblia; aceita o texto das Escrituras como verdadeiro, e se recusa a se envolver no processo triplo de dissecação, conjectura e reconstrução hipotética (frequentemente contrário às alegações do texto) que está no cerne de todas as análises histórico-críticas.
Alguns estudiosos evangélicos nas últimas décadas tentaram “reabilitar” o método histórico-crítico removendo seu viés antissobrenatural e outras características censuráveis, ainda empregando o método. No entanto, os adventistas acreditam que isso não é realmente possível, porque as pressuposições e o método estão inextricavelmente entrelaçados. A base do método histórico-crítico é a ciência histórica secular, que por sua própria natureza exclui metodologicamente o sobrenatural e, em vez disso, busca causas naturais para eventos históricos.
O pressuposto central do método histórico-crítico é o princípio da crítica,16 segundo o qual nada é aceito ao pé da letra, mas tudo deve ser verificado ou corrigido pelo reexame da evidência. A Bíblia está sempre aberta à correção e, portanto, o intérprete humano é o determinante final da verdade, e sua razão ou experiência o teste final da autenticidade de uma passagem. Enquanto esse princípio básico for mantido, mesmo que no menor grau, o perigo do método histórico-crítico não foi evitado, mesmo que o elemento sobrenatural na teoria seja aceito. E se este princípio de crítica for removido, ele deixa de ser um método histórico-crítico. A presença ou ausência do princípio fundamental da crítica é realmente o teste decisivo para saber se a metodologia crítica está sendo empregada ou não. Os adventistas do sétimo dia tomaram uma posição oficial contra até mesmo uma versão modificada do método crítico histórico que mantém o princípio da crítica: “Mesmo um uso modificado deste método [o histórico-crítico] que mantém o princípio da crítica que subordina a Bíblia à razão humana é inaceitável para os adventistas.”17
Aqueles que seguem o método histórico-bíblico aplicam as mesmas ferramentas de estudo utilizadas na crítica histórica. Há uma atenção cuidadosa dada aos detalhes históricos, literários e linguísticos, gramatical-sintáticos e teológicos, como descreveremos na próxima seção deste artigo. Mas ao utilizar os ganhos trazidos pelo método histórico-crítico para afiar várias ferramentas de estudo para análise do texto bíblico, há uma intenção consistente no estudo histórico-bíblico de eliminar o elemento de crítica que permanece como juiz da Palavra.
Há uma grande mudança de paradigma recente nos estudos bíblicos críticos em direção a várias novas abordagens hermenêuticas crítico-literárias. Esses procedimentos críticos geralmente não negam os resultados da crítica histórico-histórica, nem abandonam o princípio central da crítica, mas, ao contrário, colocam entre parênteses as questões históricas relativas ao desenvolvimento histórico do texto bíblico e concentram-se em sua forma canônica final.
Muitas dessas abordagens hermenêuticas crítico-literárias concentram-se na forma final do texto bíblico como uma obra de arte literária. Essas abordagens sincrônicas (isto é, abordagens que lidam com a forma final do texto) incluem procedimentos (sobrepostos) como Crítica Retórica (James Muilenberg), Nova Crítica Literária (análise poética e narrativa, Robert Alter) e leitura atenta (Meir Weiss). O ponto em comum é a preocupação com o texto como obra de arte acabada. Os adventistas saúdam esse interesse renovado pela análise sincrônica da forma canônica recebida do texto bíblico e apreciam muitas das ferramentas de análise desenvolvidas dentro dessas abordagens. Infelizmente, porém, nessas abordagens comumente praticadas por estudiosos críticos, as produções literárias da Bíblia são geralmente divorciadas da história e consideradas como obras de ficção ou mito, com seu próprio “universo imaginativo autônomo” e “imitação da realidade.” A ênfase é colocada nas várias convenções literárias utilizadas (consciente ou inconscientemente) pelo escritor enquanto ele cria a “história” bíblica ficcional em uma obra de arte literária. Tais pressupostos que ignoram ou vão contra as alegações históricas dos textos bíblicos são rejeitados pelos intérpretes adventistas.
Outra abordagem sincrônica recente é o estruturalismo. O estruturalismo bíblico se baseia na teoria linguística moderna do teórico francês Claude Lévi-Strauss, e foi desenvolvido nos EUA por estudiosos como Daniel Patte. Seu principal objetivo é “decodificar” o texto para desvendar as “estruturas profundas” subconscientes universalmente inerentes à linguagem que se impõem deterministicamente ao escritor. O absoluto divino neste método é substituído por um absoluto vindo de baixo — as estruturas profundas da linguagem. Uma abordagem literária relacionada é a semiótica, ou “teoria dos signos”, criada por Ferdinand de Saussure e Charles S. Pierce, que se concentra nos códigos linguísticos que formam a estrutura dentro da qual a mensagem do texto é dada (muito parecido com a pauta e a clave na música onde as notas específicas podem ser colocadas). A preocupação dessas abordagens não é nem a história nem o significado do texto, mas as camadas de estruturas linguísticas ou sistemas de signos subjacentes à mensagem. Essas abordagens têm valor limitado na hermenêutica adventista, na medida em que as pressuposições fundamentais tendem a comprometer o princípio da Sola Scriptura.
Nas últimas décadas, desenvolveu-se uma série de outras abordagens da Escritura que retêm os pressupostos críticos do método histórico-crítico, mas concentram a atenção em outros objetivos que não reconstruir hipoteticamente o desenvolvimento histórico do texto bíblico. Algumas dessas abordagens pós-modernas se baseiam em novas tendências que foram mencionadas nos parágrafos anteriores. Os principais exemplos incluem: a hermenêutica filosófica (a teoria hermenêutica metacrítica de Gadamer e a hermenêutica da suspeita e recuperação de Ricoeur); hermenêutica da teoria sociocrítica, incluindo crítica sociológica (Gottwald), libertação (Gutierrez) e hermenêutica feminista (Trible); crítica de resposta do leitor (McKnight) e desconstrucionismo (Derrida).
Nessas metodologias pós-modernas, não há mais um único significado objetivo e normativo das Escrituras: há uma leitura feminista, uma leitura negra, uma leitura asiática, uma leitura luterana etc. Todos são vistos como tendo sua própria validade à medida que o horizonte do leitor se funde com o horizonte do texto bíblico. Essas últimas abordagens forneceram alguns vislumbres úteis sobre o texto bíblico e corretamente apontam a necessidade de o intérprete moderno reconhecer seu contexto cultural individual, mas a tendência comum é ter alguma norma externa — seja filosofia, sociologia, teoria política marxista, feminismo ou o subjetivismo do leitor — que substitui o princípio Sola Scriptura e relativiza as Escrituras.
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Passos Interpretativos Bíblicos Surgidos das Escrituras
A maioria dos escritores judeus e cristãos no tocante a abordagem hermenêutica adequada das Escrituras simplesmente lista os vários passos interpretativos. Mas um compromisso total com a Sola Scriptura parece implicar que todas essas diretrizes básicas também surgem explícita ou implicitamente da própria Escritura.
Podemos acrescentar aqui que muitos estudiosos modernos não consideram a própria prática hermenêutica dos escritores bíblicos um lugar muito útil para obter orientação no desenvolvimento de uma hermenêutica sólida. Alega-se que os escritores do NT muitas vezes seguem os métodos rabínicos judaicos predominantes do primeiro século de exegese que muitas vezes não são fiéis ao significado original do texto do AT. Mas a dissertação recentemente publicada por David I. Brewer, que pode estar destinada a abalar as pressuposições da atual erudição crítica sobre os métodos exegéticos judaicos do primeiro século, demonstra que “os predecessores dos rabinos antes de 70 E.C. não interpretaram as Escrituras a partir de contexto, não procurou nenhum significado nas Escrituras além do sentido simples, e não mudou o texto para se adequar à sua interpretação, embora os rabinos posteriores tenham feito todas essas coisas.18 O trabalho de Brewer exige um novo exame dos métodos exegéticos do NT à luz dessas conclusões. Este “novo exame” do NT já começou nas últimas décadas, e vários estudos de várias passagens do NT concluíram que os escritores do NT tiveram o cuidado de representar fielmente o significado claro original dos textos do AT para os leitores do NT.19
Consideremos agora as diretrizes interpretativas básicas que emergem da própria hermenêutica dos escritores da Bíblia.
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Texto e Tradução. Visto que o foco do empreendimento hermenêutico está na Palavra escrita, é de grande importância que o texto original da Bíblia seja preservado tanto quanto possível. A própria Bíblia ressalta a necessidade vital de preservar as palavras da Sagrada Escritura (ver Dt 4:2; 12:32; Pv 30:5, 6; Ap 22:18–19; cf. Dt 31:9–13, 26). Os princípios do estudo textual devem ser cuidadosamente controlados dentro das Escrituras.20
As Escrituras também dão diversos exemplos da necessidade de uma tradução fiel das palavras das Escrituras para o idioma alvo (Ne 8:8; Mt 1:23; Mc 5:41; 15:22, 34; Jo 1:42; 9 :7; At 9:36; 13:8; Hb 7:2). A tradução da Escritura deve permanecer o mais fiel possível, tanto à forma quanto ao conteúdo do original.21
Contexto Histórico/Questões Introdutórias. O AT é em grande parte um livro histórico. Os relatos da Criação, Queda, Dilúvio, Patriarcas, surgimento de Israel, Êxodo, Conquista de Canaã, Juízes, Reis e Profetas da Monarquia Unida e dividida, Exílio, Retorno, reconstrução do Templo — todas as pessoas, eventos e instituições do AT são apresentados como uma história direta. Os profetas posteriores do AT, Jesus e os escritores do NT continuamente se referem aos relatos anteriores do AT, interpretando-os como descrições historicamente confiáveis das reais interrelações de Deus no espaço-tempo com seu povo. O contexto histórico das narrativas bíblicas é aceito como verdadeiro, e, portanto, não há tentativa de reconstruir a história de uma maneira diferente da apresentada no registro bíblico. Os escritores do NT, em sua interpretação do AT, mostram um conhecimento notavelmente claro com o fluxo geral e detalhes específicos da história do AT (ver, por exemplo, o discurso de Estêvão em Atos 7; a discussão de Paulo sobre o Êxodo em 1 Coríntios 10). Os argumentos tipológicos dos escritores do NT assumem a veracidade histórica das pessoas, eventos e instituições que eram tipos; de fato, toda a força de seu argumento tipológico depende da historicidade dessas realidades históricas.22
Na hermenêutica escriturística interna dos escritores bíblicos, muitas vezes são mencionadas várias questões de introdução, e essas questões às vezes se tornam cruciais para o argumento do autor da Bíblia. Em cada caso, a declaração evidente do texto é aceita como retratando com precisão a autoria, cronologia e cenário de vida do texto. Por exemplo, a autoria davídica do Salmo 110 (como declarada no cabeçalho do salmo) é crucial para o argumento final e irrefutável de Jesus sobre sua messianidade (Mt 22:41-46). Novamente, a autoria davídica do Salmo 16 também é crucial para Pedro em seu sermão de Pentecostes para convencer os judeus da ressurreição predita do Messias (At 2:25–35).
O contexto vital (Sitz im Leben) da justificação pela fé de Abraão no relato de Gênesis é muito significativo no argumento de Paulo aos romanos, para mostrar que o evento foi antes de Abraão ser circuncidado (Rm 4:1–12). Para Paulo, não se trata de um cenário de vida hipoteticamente reconstruído que deu origem ao relato, mas o apóstolo — e todos os outros escritores bíblicos consistentemente ao longo das Escrituras — aceitam o cenário de vida que é apresentado no texto bíblico.
Assim, por preceito e exemplo, a Escritura ressalta a importância de interpretar o material bíblico em seu sentido literal e histórico, incluindo detalhes de cronologia, geografia e intervenções divinas milagrosas na história.
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Contexto/análise literária. Para os escritores bíblicos, o contexto literário das Escrituras não era menos importante do que o contexto histórico. A Escritura não é apenas um livro de história, mas uma obra de arte literária. Um estudo recente está dando cada vez mais atenção às características literárias e convenções das Escrituras.23
A própria Escritura nos dá inúmeros indicadores explícitos e implícitos da presença de suas qualidades literárias e da importância de reconhecê-las como parte da tarefa hermenêutica.
Uma das primeiras tarefas na interpretação de uma determinada passagem em seu contexto literário imediato é determinar os limites da passagem, em termos de parágrafos, perícopes ou estrofes. Embora as divisões de parágrafos e capítulos de nossas versões modernas da Bíblia tenham sido adicionadas muito mais tarde do que os tempos bíblicos, os escritores bíblicos muitas vezes forneceram indicadores de limites de passagem e em sua interpretação das Escrituras anteriores mostram consciência das unidades discretas das Escrituras. No livro de Gênesis, por exemplo, o livro é dividido ordenadamente em dez seções, cada uma identificada pela frase “as gerações [toledōth] de . . . .” Nos Salmos, juntamente com os cabeçalhos que introduzem salmos individuais, vários salmos contêm (a) estrofes que dividem naturalmente as seções do salmo (ver, e.g., Sl 42:5, 11; 43:5), ou ( b) o termo “selah” (71 vezes em Salmos: e.g.,, Sl 46:3, 7, 11), ou (c) um acróstico (e.g., Salmo 119, com cada oito versículos sucessivos começando com a próxima letra do hebraico alfabeto).
Os escritores bíblicos repetidamente identificam seus materiais escritos em termos de gêneros ou tipos literários específicos. Alguns exemplos incluem: “história” ou “relato” (hebraico toledōth, Gn 2:4, mais 12 vezes ao longo de Gênesis), questões jurídicas (Êx 21:1; Dt 4:44, 45; e em todo o Pentateuco), aliança e renovação (e.g., todo o livro de Deuteronômio; veja Dt 29:1, 14, 15), enigmas (Jz 14:10–18), crônicas da corte (e.g., 1 Rs 9:1), salmos (com vários subdivisões de tipos de salmos, indicadas nos cabeçalhos) ou cânticos (Ct 1:1), provérbios (por exemplo, Pv 1:1; 10:1; 25:1), oráculos proféticos ou “fardos” (hebraico massā, e.g., Na 1:1; Hc 1:1; Ml 1:1), visões (e.g., Dn 8:1–2; Ob 1), processo pactual (hebraico rîb, por exemplo, Is 3:13; Os 4:1; Mq 6:1), lamentação (hebraico qînāh, Ez 27:32; Ams 5:1; Lamentações), evangelhos (e.g., Mc 1:1), parábolas (e.g., Mc 4:2), “figuras” (grego paraoimia; João 10:6; 16:25), epístolas (e.g., Rm 16:22; 1 Co 5:9; 2 Pe 3:1, 16. incluindo paulina, petrina, joanina, Tiago e Judas), e apocalíptico (o apokalypsis ou Revelação de João; Ap 1:1). Cada um desses gêneros tem características especiais que emergem de um estudo cuidadoso, e essas características são muitas vezes significativas na interpretação da mensagem que é transmitida através do tipo literário específico. A forma literária e a interpretação do conteúdo andam de mãos dadas.
Na representação mais geral do gênero literário, os materiais bíblicos se separam em poesia e prosa. As seções poéticas das Escrituras (cerca de 40% do AT) são caracterizadas particularmente por vários tipos de paralelismo (“rima pensada”), e, em menor grau, por métrica e estrofes. A prosa pode ser de vários tipos, como material narrativo, jurídico e cultual.
A estrutura literária, tanto no nível macroestrutural quanto no microestrutural, é uma parte crucial da análise de uma passagem, muitas vezes fornecendo uma chave para o fluxo de pensamento ou temas teológicos centrais. Os escritores da Bíblia estruturaram seu material por meio de dispositivos como paralelismo correspondente (ver o livro de Jonas24), paralelismo reverso (ou quiasma, por exemplo, os livros de Levítico25 e Apocalipse26), inclusio ou “encaixe” (e.g., Sl 8:1, 9; 103:1, 22), acróstico (Sl 9, 10, 25, 34, 37, 111, 112, 119, 145), qinah (e.g.,, o livro de Lamentações27) e componentes do tratado de suserania (e.g., o livro de Deuteronômio28).
Muitas outras técnicas e convenções literárias e elementos estilísticos são utilizados pelos escritores bíblicos. Encontramos o emprego de ironia, metonímia, símile, metáfora, sinédoque, onomatopeia, assonância, paronomásia (trocadilho/jogo de palavras), etc. Todas essas figuras de linguagem são importantes para o escritor bíblico, pois contribuem para o enquadramento e formação da mensagem, e são essenciais para o intérprete examinar enquanto busca entender o significado de uma determinada passagem.
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Análise Gramatical/Sintática/Semântica das Escrituras, e, em particular, como o NT interpreta o AT, fornecem evidências para analisar as formas gramaticais e relações sintáticas, com atenção ao significado de várias palavras no contexto, a fim de chegar a no significado claro e direto da passagem que está sendo interpretada.
Um exemplo clássico de sensibilidade gramatical por parte dos escritores do NT está na interpretação de Paulo da palavra “semente” em Gálatas 3. Citando Gênesis 12:7, 22:17–18 e 24:7, Paulo reconhece (Gl 3:16) que a forma singular de “semente” se estreita no significado de “semente” única — o Messias — enquanto alguns versos depois (Gl 3:29) ele aponta corretamente para o aspecto plural coletivo desse mesmo termo em seu contexto mais amplo.29
Um exemplo vívido da sensibilidade sintática do apóstolo está na citação do Salmo 45:6–7 em Hebreus 1:8–9: “O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre; cetro de justiça é o cetro do teu reino. Amaste a justiça e odiaste a iniquidade; por isso, Deus, o teu Deus, te ungiu com o óleo de alegria como a nenhum dos teus companheiros.” A sintaxe do original hebraico aponta para Aquele que é Deus, que também é ungido por Deus, implicando assim a relação entre o Pai e o Filho na Divindade.
Existem numerosos exemplos nas Escrituras onde os escritores do NT são cuidadosos em representar fielmente o significado de palavras cruciais na passagem original do AT. Observe, e.g., o uso de Paulo de “o justo viverá pela fé” (Rm 1:17 citando Hc 2:430); a seleção de Mateus da LXX parthenos “virgem” para melhor representar o hebraico almāh de Is 7:14 (“Uma virgem conceberá . . .”, Mt 1:22–2331); e o uso de Cristo da palavra “deuses” em João 10:34, citando Salmo 82:6.32
Numerosos outros exemplos podem ser citados, onde a citação do NT de uma passagem do AT envolve o reconhecimento do escritor do NT do contexto mais amplo da citação do AT. Este contexto maior do AT é frequentemente a chave para entender a interpretação feita pelo escritor do NT. Por exemplo, C. H. Dodd mostrou como Pedro alude ao contexto maior de Joel 2 em seu sermão de Pentecostes, e, novamente, como a interpretação de Mateus de Oseias 11:1 em Mateus 2:15 não está tirando a passagem do AT fora de contexto, mas, em vez disso, vê-lo no contexto mais amplo da temática escatológica/messiânica do Novo Êxodo em Oseias e nos outros profetas do século VIII.33
A análise gramatical-sintática e semântico-contextual muitas vezes se torna mais complexa para nós hoje do que para aqueles cuja língua nativa era o hebraico bíblico/aramaico ou o grego koiné. É necessário agora fazer uso de gramáticas, léxicos, concordâncias, dicionários teológicos e comentários apropriados.
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Contexto Teológico/Análise. Os escritores bíblicos fornecem evidências abundantes para a necessidade de apurar a mensagem teológica de uma passagem como parte do empreendimento hermenêutico.
Exemplificando, Jesus expõe as implicações teológicas de longo alcance do Decálogo em seu Sermão do Monte (Mt 5:17–28). O Concílio de Jerusalém estabelece a importância teológica de Amós 9:11–12 — que os gentios não precisam se tornar judeus para se tornarem cristãos (At 15:13–21). Paulo capta a essência teológica do pecado em diversas passagens do AT (Rm 3:8–20) e da justificação pela fé em sua exposição de Gênesis 15:6 e Salmo 32:1–2 (Rm 4). O sermão de Pedro no Pentecostes (At 2) delineia a teologia da escatologia iniciada em Joel 2, e sua primeira epístola explora as dimensões teológicas da obra expiatória do Messias conforme estabelecido em Isaías 53 (1 Pe 2:21–25).
As mensagens teológicas dos escritores do NT pressupõem, constroem e estão em continuidade com os principais temas teológicos do AT, como Deus, Homem, Criação-Queda, Pecado, Aliança, Sábado, Lei, Promessa, Remanescente, Salvação, Santuário e Escatologia.
Os escritores do NT também colocam suas análises teológicas de passagens específicas dentro do contexto mais amplo do “grande tema central” multíplice ou meta-narrativa das Escrituras, conforme estabelecido nas páginas de abertura e fechamento da Bíblia (Gn 1–3; Ap 20–2234): criação e o projeto divino original para este mundo, o caráter de Deus, o surgimento do conflito moral cósmico (Grande Conflito) no cenário do santuário, o plano de redenção-restauração centrado em Cristo e sua obra expiatória, e o juízo escatológico e o fim do pecado no clímax da história.35
Os padrões teológicos de pensamento dos escritores do NT, embora expressos em grego, permanecem dentro da trajetória do pensamento hebraico bíblico e não absorvem formas de pensamento estranhas da cultura circundante predominante, como o gnosticismo e o dualismo platônico.36
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O Significado Mais Profundo das Escrituras. Em sua exploração do significado “mais profundo” das Escrituras, em particular no que diz respeito ao cumprimento tipológico de pessoas, eventos e instituições do AT, os escritores do NT não remontam ao AT o que já não está lá (“eisegese inspirada”), ou o que não é aparente para o pesquisador humano (Sensus Plenior), ou uma atribuição arbitrária de sentido que retira a “casca” histórica (alegoria). Em vez disso, eles permanecem fiéis às Escrituras do AT, que já indicaram quais pessoas, eventos e instituições Deus designou divinamente para servir como prefigurações de Jesus Cristo e das realidades evangélicas trazidas por ele.37 Os escritores do NT simplesmente anunciam o cumprimento antitípico do que já foi indicado verbalmente pelos profetas do AT.
Os escritores do NT não dão uma lista exaustiva dos tipos do AT, mas mostram o procedimento hermenêutico, controlado pelos indicadores do AT, de identificar os tipos bíblicos. Além disso, os escritores do NT fornecem uma subestrutura teológica (histórico-soteriológica) para interpretar o cumprimento escatológico dos tipos do AT. Baseado em uma compreensão teológica clara do reino teocrático de Israel e das profecias do reino dentro do contexto das bênçãos e maldições da aliança, o NT revela um cumprimento em três estágios dos tipos do AT e das profecias do reino — em Cristo, na igreja e no desfecho apocalíptico da história da salvação. Cada estágio tem uma modalidade diferente de cumprimento com base na natureza da presença e do reinado de Cristo.38 Assim, os escritores do NT elaboraram uma hermenêutica sólida para interpretar os tipos e as profecias do reino do AT, construídas sobre controles sólidos decorrentes das escrituras do AT.
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Aplicação Contemporânea. Para os escritores bíblicos do NT, a aplicação contemporânea surge naturalmente de sua interpretação teológica das passagens do AT. Acabamos de notar como a aplicação dos tipos e profecias do reino do AT surge da compreensão do cumprimento de três estágios na história da salvação. Todas as promessas de Deus têm seu sim e amém em Cristo (2 Co 1:20), e todos os tipos do AT encontram seu cumprimento básico nele; e se somos espiritualmente parte do corpo de Cristo, portanto, compartilhamos o cumprimento dessas promessas proféticas e tipológicas, e ainda aguardamos compartilhar em seu glorioso cumprimento apocalíptico literal final. Esses princípios hermenêuticos básicos que tratam do cumprimento das profecias centradas em Israel no NT fornecem uma abordagem cristocêntrica que protege contra o dispensacionalismo e o literalismo.
Os escritores bíblicos insistem que a mensagem das Escrituras não é limitada à cultura, aplicável apenas a um certo povo e a um certo tempo, mas permanente e universalmente aplicável. Pedro, citando Isaías 40:6–8, afirma vigorosamente: “regenerados não de semente corruptível, mas de semente incorruptível, mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente. Porque “toda a humanidade é como a erva do campo, e toda a sua glória é como a flor da erva. A erva seca, e a flor cai; mas a palavra do Senhor permanece para sempre.” Esta palavra é o evangelho que foi anunciado a vocês” (1 Pe 1:23–25).
A maior parte da instrução ética nos evangelhos e epístolas do NT pode ser vista como a aplicação homilética prática de passagens do AT: por exemplo, o Sermão da Montanha de Jesus (Mt 5:17–32) aplicando os princípios do Decálogo; aplicação dos princípios de Levítico 19 por Tiago em toda a sua epístola; e a instrução ética de Pedro baseada em “Sede santos, porque eu sou santo” (1 Pe 1:16; citando Lv 11:44, 45; 19:2; 20:7).
Naturalmente certas partes do AT, em particular as leis rituais cerimoniais/santuários e a aplicação das leis civis/teocráticas de Israel, não são mais obrigatórias para os cristãos. Os escritores do NT não decidem arbitrariamente (por uma abordagem de livro de casos às Escrituras) quais leis ainda são relevantes, mas reconhecem consistentemente os critérios dentro do próprio AT indicando quais leis são universalmente obrigatórias.39
O princípio geral, então, articulado e ilustrado pelos escritores do NT em sua aplicação homilética das Escrituras, é assumir a relevância transcultural e transtemporal da instrução bíblica, a menos que a própria Escritura nos dê critérios limitando essa relevância. Como William Larkin afirma, “toda a Escritura, incluindo forma e significado, é obrigatória, a menos que a própria Escritura indique o contrário.”40
O objetivo final da interpretação das Escrituras é aplicar na prática cada passagem à vida da pessoa. Cristo e os apóstolos do NT repetidamente levaram a mensagem do evangelho contida nas Escrituras para levar os ouvintes ou leitores à salvação e a um relacionamento pessoal cada vez mais próximo com Deus.
No Êxodo, Deus articulou um princípio em que cada geração sucessiva de israelita deveria considerar que ele/ela saiu pessoalmente do Egito (Êx 12:26–27; 13:8–9), e este princípio de personalização foi repetido muitas vezes, tanto para o Israel do AT (Dt 5:2–4; 6:20–21; Js 24:6–8) quanto para o Israel espiritual (Gl 3:29; Ap 15:1–2; 2Co 5:14–15, 21; Rm 6:3–6; Ef 1:20; 2:6; Hb 4:3, 16; 6:19; 7:9–10; 10:19–20; 12:22–24). As Escrituras devem ser lidas e aceitas como se eu fosse o participante dos poderosos atos salvadores de Deus — “Eu estou lá!” — como se as mensagens de Deus fossem dirigidas pessoalmente a mim. Elas são a Palavra viva e ativa de Deus para minha alma.
Notas
1 Para uma visão geral dessas abordagens hermenêuticas, ver Anthony C. Thiselton, New Horizons in Hermeneutics: The Theory and Practice of Transforming Biblical Reading (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House, 1992).
2 Este não é o lugar para uma discussão completa de Revelação-Inspiração-Iluminação. A doutrina da revelação-inspiração é fundamental para todo o empreendimento da interpretação bíblica. De acordo com o registro bíblico, Deus revelou a si mesmo e sua vontade em declarações específicas de verdade proposicional aos seus profetas (Hb 1:1). Através da inspiração do Espírito, ele capacitou seus profetas a comunicar a revelação divina como a Palavra de Deus confiável e autorizada (2 Tm 3:15–16; 2 Pe 1:19–21). O mesmo Espírito que inspirou os profetas foi prometido para iluminar as mentes daqueles que procuram entender o significado da revelação divina (Jo 14:26; 1 Co 2:10–14).
3 Este é um documento preparado por um único autor, que não foi votado ou aprovado pelo Concílio Anual da Igreja Adventista do Sétimo Dia ou Sessão da Associação Geral, e, portanto, não pretende ser uma declaração oficial de crenças dos adventistas do sétimo dia sobre a interpretação das Escrituras. Representa a tentativa de um estudioso em elaborar o entendimento adventista em como interpretar as Escrituras, em harmonia com os ensinamentos bíblicos, conforme estão resumidos na Declaração Adventista do Sétimo Dia de Crenças Fundamentais e do documento “Métodos de Estudo da Bíblia” votado pelo Concílio Anual dos adventistas do sétimo dia em 1986. Muitos desses pontos são adaptados do artigo do autor, “Biblical Interpretation,” em the Handbook of Seventh-day Adventist Theology, Commentary Series, vol. 12 (Hagerstown, MD: Review and Herald, 2000), pp. 58–104.
4 O termo Sola Scriptura é melhor traduzido como uma frase ablativa (“Somente pelas Escrituras”) em paralelo com as outras duas frases definidoras da Reforma Protestante, Sola Fidei “somente pela fé” e Sola Gratia “somente pela graça.”
5 Ver, especialmente, Fernando Canale, “Philosophical Foundations and the Biblical Sanctuary,” Andrews University Seminary Studies 36/2 (Outono 1998): 183–206.
6 Ver, especialmente, Gerhard F. Hasel, “Divine Inspiration and the Canon of the Bible,” Journal of the Adventist Theological Society 5/1 (1994): 68–105.
7 Para uma discussão adicional sobre razões adicionais pelas quais os protestantes (incluindo os adventistas) não aceitam a canonicidade dos apócrifos, ver, por exemplo, Norman L. Geisler e Ralph E. MacKenzie, Roman Catholics and Evangelicals: Agreements and Differences (Grand Rapids, MI: Baker, 1995), pp. 157–175; Hasel, pp. 74–75.
8 Para discussão do novo consenso acadêmico que rejeita a teoria mais antiga de que o cânone do AT não foi fixado até o Concílio de Jâmnia, ver Hasel, pp. 90–96; e Jack P. Lewis, “Jamnia Revisited.” em The Canon Debate, ee. Lee Martin McDonald e James A. Sanders (Peabody, MA: Hendrickson, 2002), pp. 146–162.
9 Bruce M. Metzger, The Canon of the New Testament: Its Origin, Development, and Significance (Oxford: Clarendon Press, 1987), p. 287.
10 Adaptado de Geisler e McKenzie, p. 173.
11 Ver J. H. Gerstner, “Law in the NT,” ISBE (1986), pp. 85–88.
12 Ver Walter C. Kaiser, Jr., Toward an Old Testament Theology (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1978), pp. 8, 14, 22; idem, Toward an Exegetical Theology: Biblical Exegesis for Preaching and Teaching (Grand Rapids, MI: Baker, 1981), pp. 134–140.
13 Este talvez seja um lugar apropriado para mencionar brevemente o papel da igreja na interpretação das Escrituras e na formulação de declarações doutrinárias. O Preâmbulo das “Crenças Fundamentais dos Adventistas do Sétimo Dia” declara: “Os Adventistas do Sétimo Dia aceitam a Bíblia como seu único credo e mantêm certas crenças fundamentais como sendo o ensino das Sagradas Escrituras. Essas crenças. . . constituem a compreensão e expressão da igreja do ensino das Escrituras. A revisão dessas declarações pode ser esperada em uma assembleia da Associação Geral quando a igreja for guiada pelo Espírito Santo a uma compreensão mais completa da verdade bíblica ou encontrar uma linguagem melhor para expressar os ensinamentos da Santa Palavra de Deus” (Anuário Adventista do Sétimo Dia 2003 [Hagerstown, MD: Review and Herald], p. 5).
14 Edgar V. McKnight, Post-Modern Use of the Bible: The Emergence of Reader-Oriented Criticism (Nashville: Abingdon Press, 1988), p. 45.
15 Gerhard Maier, The End of the Historical Critical Method (St. Louis: Concordia, 1977), p. 23.
16 A palavra “crítica” é usada aqui em seu sentido técnico de “dúvida metodológica” cartesiana. Ver Edgar Krentz, The Historical-Critical Method, Fortress Guides to Biblical Scholarship (Philadelphia: Fortress, 1975), pp. 56–57.
17 Relatório da Comissão de Métodos de Estudo Bíblico, aprovado no Concílio Anual, 1986, impresso na Adventist Review, 22 de janeiro de 1987, p. 5.
18 David I. Brewer, Techniques and Assumptions in Jewish Exegesis Before 70 E.C. (Tubingen: J. C. B. Mohr, 1992), p. 1.
19 Ver, e.g., Gleason L. Archer, Encyclopedia of Bible Difficulties (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House, 1982); George B. Caird, “The Exegetical Method of the Epistle to the Hebrews,” Canadian Journal of Theology 5 (1959): pp. 49–51; Richard M. Davidson, “Typology in the Book of Hebrews,” em Issues in the Book of Hebrews, Daniel and Revelation Committee Series, vol. 4, e. Frank B. Holbrook (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 1989), pp. 121–186; idem, “Sanctuary Typology,” em Symposium on Revelation–Book I, Daniel and Revelation Committee Series, vol. 6, e. Frank B. Holbrook (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 1992), pp. 99–130; idem, “Revelation/Inspiration in the Old Testament: A Critique of Alden Thompson’s ‘Incarnational’ Model,” em Issues in Revelation and Inspiration, Adventist Theological Society Occasional Papers, vol. 1, ee. Frank Holbrook e Leo Van Dolson (Berrien Springs, MI: Adventist Theological Society Publications, 1992), pp. 105–135; Charles H. Dodd, According to the Scriptures; The Substructure of New Testament Theology (London: Collins, 1952), pp. 59–60; R. T. France, Jesus and the Old Testament; His Application of Old Testament Passages to Himself and His Mission (Downers Grove, IL: Inter-Varsity Press, 1971), pp. 38–80; Walter C. Kaiser, The Uses of the Old Testament in the New (Chicago: Moody Press, 1985); Lester J. Kuyper, The Scripture Unbroken (Grand Rapids, MI: W. B. Eerdmans Publishing Company, 1978); Douglas J. Moo, The Old Testament in the Gospel Passion Narratives (Sheffield, England: Almond Press, 1983); R. M. Moody, “The Habakkuk Quotation in Rom 1:17,” ExpT 92 (1981): 205–208. Isso não quer dizer que toda vez que uma Escritura é mencionada em uma passagem, os autores do NT estão tentando uma exegese da passagem. Assim como hoje podemos dizer que escapamos “por um triz” sem fazer exegese de Jó 19:20, os escritores bíblicos estão imersos em linguagem e imagens do AT, e podem usar linguagem bíblica sem a intenção de fazer exegese da passagem aludida. Referimo-nos antes àqueles casos do NT em que o escritor bíblico está expondo claramente o significado das passagens do AT.
20 Para um resumo dos princípios básicos da análise textual, veja, por exemplo, Bruce K. Waltke, “The Textual Criticism of the Old Testament,” em The Expositor’s Bible Commentary, vol. 1, e. Frank E. Gaebelein (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House, 1979), pp. 211–228; Gordon D. Fee, “The Textual Criticism of the New Testament,” em The Expositor’s Bible Commentary, vol. 1, e. Frank E. Gaebelein (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House, 1979), pp. 419–433; C. F. Sitterly e J. H. Greenlee, “Text and MSS of the OT,” em The International Standard Bible Encyclopedia (Grand Rapids, MI: W. B. Eerdmans Publishing Company, 1988), 4:798–822.
21 Para uma discussão dos princípios básicos do método de tradução, ver Eugene A. Nida, Toward a Science of Translating, with Special Reference to Principles and Procedures Involved in Bible Translating (Leiden: E. J. Brill, 1964); John Beekman e John Callow, Translating the Word of God, With Scripture and Topical Indexes (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House, 1974); Sakae Kubo e Walter F. Specht, So Many Versions? Twentieth Century English Versions of the Bible, rev. e ampl. e. (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House,1983); e Jack P. Lewis, The English Bible from KJV to NIV: A History and Evaluation, 2ª e. (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1991).
22 Richard M. Davidson, Typology in Scripture: A Study of Hermeneutical τύπoς Structures, Andrews University Seminary Doctoral Dissertation Series, vol. 2 (Berrien Springs, MI: Andrews University Press, 1981).
23 Infelizmente, porém, isso muitas vezes vem à custa de ignorar a natureza histórica do material; as Escrituras são frequentemente tratadas da mesma maneira que uma obra de ficção moderna, com seu próprio mundo de histórias fictícias. Ver, e.g., Robert Alter, The Art of Biblical Narrative (Nova York: Basic Books, 1981); idem, The Art of Biblical Poetry (New York: Basic Books, 1985); Thiselton, New Horizons in Hermeneutics, pp. 471–514; Meir Weiss, The Bible from Within: The Method of Total Interpretation (Jerusalem: Magness Press, 1984).
24 Gerhard F. Hasel, Jonah, Messenger of the Eleventh Hour (Mountain View, CA: Pacific Press, 1976), p. 101.
25 William Shea, “Literary Form and Theological Function in Leviticus,” em 70 Weeks, Leviticus, Nature of Prophecy, Daniel and Revelation Committee Series, vol. 3, e. Frank B. Holbrook (Washington, DC: Biblical Research Institute, 1986), p. 149.
26 Kenneth A. Strand, “The Eight Basic Visions,” em Symposium on Revelation–Book I, Daniel and Revelation Committee Series, vol. 6, e. Frank B. Holbrook (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 1992), pp. 36–37.
27 William H. Shea, “The qinah Structure of the Book of Lamentations,” Biblica 60/1 (1979): 103–107.
28 Meredith G. Kline, Treaty of the Great King: The Covenant Structure of Deuteronomy (Grand Rapids, MI: W. B. Eerdmans Publishing Company, 1963).
29 Observe em particular o uso de zera’ em Gênesis 22:17, onde a primeira ocorrência da palavra no versículo claramente tem uma ideia plural no contexto de “as estrelas do céu” e “a areia que está à beira do mar,” enquanto a segunda ocorrência de zera’ no versículo 17b se reduz a uma “semente” singular no contexto de “seus [singulares] inimigos.” Esse uso é paralelo a Gênesis 3:15, onde de maneira semelhante a palavra zera’ passa de coletivo/plural para singular em significado. Ver O. Palmer Robertson, Christ of the Covenants (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1980), pp. 93–103.
30 Ver Moody, pp. 205–208.
31 Ver Archer, Encyclopedia of Bible Difficulties, pp. 266–268.
32 Ver ibid, pp. 373–374.
33 Dodd, According to the Scriptures, pp. 59–60; cp. Kaiser, The Uses of the Old Testament in the New, pp. 43–53.
34 Cp. Ellen G. White, Educação, pp. 125, 190.
35 Ver Richard M. Davidson, “Cosmic Metanarrative for the Coming Millennium,” Journal of the Adventist Theological Society 11 (2000): 102-119.
36 Para análise do pensamento hebraico, ver, e.g., Claude Tresmontant, A Study of Hebrew Thought, trad. Michael F. Gibson (New York, NY: Desclee Company, 1960); Jacques B. Doukhan, Hebrew for Theologians, A Textbook for the Study of Biblical Hebrew in relation to Hebrew Thinking (Lanham, MD: University Press of America, 1993); e Thorleif Boman, Hebrew Thought Compared with Greek, trad. Jules L. Moreau (New York: W. W. Norton, 1970; Filadélfia, PA: Westminster Press, 1960; cuja tese básica não foi derrubada apesar das críticas de algumas linhas de argumentação de James Barr, A Semantics of Biblical Language [Londres: Oxford University Press, 1961]). Ver também G. E. Ladd, cuja Theology of the New Testament (Grand Rapids, MI: W. B. Eerdmans Publishing Company, 1974) mostrou o padrão escatológico consistente, histórico-salvação, consumado-consumido bíblico em todo o NT. Isso também é verdade em relação ao livro de Hebreus, apesar das inúmeras alegações de dualismo platônico no livro. Veja a refutação decisiva de Ronald Williamson dessas afirmações em Philo and the Epistle to the Hebrews (Leiden: E. J. Brill, 1970).
37 Ver Davidson, “Sanctuary Typology,” pp. 106, 128.
38 Ver ibid, pp. 106–108, 129, 130, e Hans K. LaRondelle, “The Israel of God in Prophecy: Principles of Prophetic Interpretation,” Andrews University Monographs, Studies in Religion, vol. 13 (Berrien Springs: Andrews University Press, 1983).
39 Davidson, “Revelation/Inspiration in the Old Testament,” pp. 119–125.
40 Ver William J. Larkin, Culture and Biblical Hermeneutics: Interpreting and Applying the Authoritative Word in a Relativistic Age (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1988), p. 316, que lista vários critérios possíveis para não normatividade dentro das Escrituras: “recipiente limitado, condições culturais limitadas para cumprimento, racionalidade cultural limitada ou um contexto maior limitador.” Mesmo esses casos, argumenta Larkin, envolvem apenas a forma, e não o significado das Escrituras, e exigem a redução da forma cultural específica a um princípio e a substituição de uma forma contemporânea compatível com ela. Ver Larkin, pp. 316–318, para ilustrações tiradas do modo como os escritores do NT usaram o AT.
Do muito que se poderia facilmente refutar do presente artigo (como a caricatura feita do método histórico crítico e a afirmação absurda de que a abordagem “gramático-histórico” tem as características de um método!), o que mais me chama a atenção é que grande parte das doutrinas adventistas contraria na prática frontalmente a maioria daquilo que o autor defende. Ou seja, se autor realmente acredita que a verdade bíblica deve ser alcançada por tais critérios, considerando que os pioneiros adventistas, incluindo Jose Bates, J.N.Andrews, e especialmente EGW leu a Bíblia ignorando/violando tais princípios e, com base na leitura deles, foram formuladas as crenças distintivas da IASD, então, por uma questão de coerência lógica, tais doutrinas nada tem a ver com a pretendida “verdade” bíblica.
Outra coisa “interessante” é que o autor, ao recortar versículos (à moda adventista) do AT e do NT para definir o que estaria incluído no termo “Escritura”, deixou de fora um fato escancaradamente sabido seja por intérpretes seja por historiadores: os primeiros cristãos, tal como os judeus, tinham como parte de sua Escritura livros que só posteriormente foram considerados apócrifos, como é o caso do livro de Henoc citado no livro de Judas; os “Salmos de Salomão”, não apenas muito lido e crido, mas grande responsável pelas expectativas que se tinham sobre o papel e atuação do Messias, além de outros livros que muito tardiamente deixaram o cânon (mas os escritores bíblicos criam neles).
Deixando de lado outras manobras que autor faz, ao contrário do que foi dito dos antigos rabinos, não é possível dizer que também o adventismo “não mudou o texto para se adequar à sua interpretação”. O corpo doutrinário do adventismo fez o faz manipulações evidentes e gritantes para impor sua convicção ao texto bíblico, a ponto de não apenas se distanciar de modo escancarado do sentido elementar e “simples” do texto, mas há casos de explícita CONTRADIÇÃO, ou seja, faz o texto dizer o contrário do que pretende. Exemplos mais claros disso se vê em como Romanos 7 é solapado pelo Tratado de Teologia para fazer Paulo dizer o oposto daquilo que escreve; além da manipulação das palavras “lei” e “mandamento” que, contrariando seu contexto escriturítico simples e óbvio, o adventismo a faz determinados versículos do NT significarem “decálogo” onde é absolutamente impossível que este seja o sentido.
Por fim, é um texto escrito com linguagem acadêmica e com bibliografia, mas além de não ser pesquisa de fato, não é levado a sério nem pelos próprios adventistas que propalam tais princípios hermenêuticos. Eis a prova de que não passa de mero discurso manipulador destinado a quem quer voluntariamente ser manipulado. Respeitemos tal liberdade.
Falou tudo e não disse nada. Parabéns! 👏🏻